Em um breve resumo histórico, pode-se
constatar que o começo da ciência moderna foi precedido e acompanhado pelo
pensamento filosófico que levou a humanidade a uma formulação extrema do
dualismo espírito/matéria. Descartes (1976) via o Universo como sendo dividido
em dois reinos distintos: o da mente (res
cogitans) e o da matéria (res extensa).
Atribui-se a Descartes, marco da filosofia
moderna, o método de avaliação, que utiliza o procedimento da dedução e
persiste até hoje na rotina científica. Utilizando a linguagem matemática, Descartes
converteu o mundo material a uma imensa máquina. Para ilustrar sua ideia usou
como exemplo a imagem de um relógio. Diante de qualquer defeito neste
“relógio”, ou seja, no mundo, bastaria trocar a peça defeituosa (Descartes,
1976). Dessa forma, nasce o reducionismo que viria a nortear toda a ciência
ocidental (Capra,1998).
Se foi nos sonhos do dia 10 para o dia 11
de novembro de 1619, com 23 anos de idade, que Descartes percebeu a
possibilidade de criar a ciência “definitiva” utilizando a matemática, foi
acordando de um sonho, quando uma maçã caiu em sua cabeça, que Newton teria seu
famoso insight despertando para a lei
da gravidade. Não sendo filósofo, este físico inglês nasceu 23 anos após os
sonhos reveladores de Descartes e teve a interpretação de sua obra como base
filosófica no século XVII (Capra,1998).
Sob a influência deste recortado
referencial dito racionalista, Newton desenvolveu a sua famosa Teoria Mecânica,
que foi o principal fundamento da física clássica. Nela, o mundo era entendido
como um conjunto de partes isoladas e independentes, regidas por leis
previsíveis numa dimensão de tempo linear. Em seu conceito de tempo, ele se
deslocaria do passado, percorreria o presente e se direcionaria para o futuro.
Um sentido direcional também chamado de “flecha do tempo” (Grof,1987;
Capra,1998).
Stewart (1991) comenta que Newton também
se referia ao universo como uma máquina. Nesta visão, uma máquina é acima de
tudo previsível e “sob condições
idênticas fará coisas idênticas”. Segundo este autor, os cientistas do
século XVII e XVIII foram compelidos a pensar assim, diante de um universo tão
cheio de encantamentos e surpresas.
Torna-se importante então, esclarecer que o termo
newtoniano-cartesiano deverá ser entendido como representante de uma percepção
da realidade composta por inúmeras partes separadas, independentes umas das
outras e regidas por leis fixas (Souza, 1998).
Essa percepção fragmentada (newtoniano-cartesiana) tem gerado
inúmeras consequências para a humanidade. Dentre todas, as consequências que, a
nosso ver, merece muita reflexão, e nesse caso é muita mesmo pelo resto de
nossas vidas, é a consequência descrita por David Bohm:
“A não percepção da
realidade como algo único e unificado, fragmentando o mundo e ignorando a
interligação dinâmica de todas as coisas, seria o erro de percepção responsável
por muitos dos nossos problemas, não só na ciência, mas em nossa vida e em
nossa sociedade. Se utilizarmos uma visão geral do mundo como constituído de
fragmentos independentes, então é assim que a nossa mente tenderá a operar.” Bohm
(1998, p.17)
Capra
(1994, p.93) também tenta explicar afirmando que:
“O fato
decisivo é que, todas as vezes que você delineia uma parte e a separa do
restante, você comete um erro. Você isola do todo algumas das interligações
física ou conceitualmente, e diz: ‘Isto agora é o que eu chamo de parte’. Sei
que ela está ligada deste e daquele modo ao resto, mas não posso levar em
consideração todas essas ligações , pois isso se torna complicado”. Por
isso, elimino algumas delas no processo de delinear a parte.” (Sem grifo no
original)
O certo é que, há várias décadas, a
transição da visão fragmentada para a visão sistêmica está em curso e todas as
áreas do conhecimento, conscientes ou não
das origens e consequências dela, estão sendo obrigadas a rever seus núcleos
paradigmáticos e a dar novas respostas tanto à própria comunidade científica
quanto à sociedade como um todo.
Como ilustração
útil que sirva como disparador de um processo de aprofundamento, poderemos
utilizar a imagem do navio naufragando em alto mar.
Imagine a
seguinte situação!
O maior e mais
sofisticado transatlântico do mundo está com inúmeros problemas e teremos que
eleger uma hierarquia entre eles para resolver primeiro os mais importantes. Os
passageiros são cientistas que estão em um congresso multidisciplinar em saúde
e os problemas apresentados foram: surto de diarreia por comida estragada, pane
na internet, roubo de joias em vários cofres das cabines, um furo no casco e
graves oscilações na corrente elétrica da casa de máquinas com risco de
incêndios. Ao saberem dos problemas, cada um teve a sua própria ideia: 1-os
epidemiologistas resolveram esvaziar todo o estoque de vacinas e imunizar a
tripulação e os passageiros; 2-o pessoal de informática tratou de impedir que
as linhas de internet ficassem congestionadas devido ao excesso de uso; 3-o
pessoal de marketing fez uma pesquisa de opinião e concluiu que 63,3% dos
entrevistados estavam com medo de morrer; 4-os psicólogos montaram ambulatórios
de emergência para reações depressivas e os médicos iniciaram uma distribuição
de medicação tranquilizante com o patrocínio do laboratório “x”; 5-os
repórteres começaram a realizar transmissões ao vivo para a sua emissora,
denunciando o problema batendo recordes de audiência; 6-os advogados já estavam
processando a empresa e pedindo indenizações milionárias; 7-os políticos
prometeram que iriam resolver tudo e davam entrevistas nos corredores; 8-os
religiosos montaram vigílias de oração para pedir a Deus uma salvação; 9-os
criminosos começaram a arrombar os cofres também da tripulação; 10-os
voluntários começaram a montar equipes de ajuda para as crianças e idosos;
11-os preguiçosos, não acreditaram e voltaram a dormir; 12-o comandante do
navio pediu ajuda a todos pelo sistema de som, mas teve que ir sozinho até a
sala de máquinas para tentar fechar o furo no casco. Se você estivesse nesse
navio, qual seria a sua prioridade? O que você teria feito?
Perceba que cada um só fazia o que sabia
e o que estava acostumado a fazer. Ninguém conseguia captar o problema
principal e mais urgente, que era o furo no casco. Se o navio afundasse, todos
morreriam e as múltiplas ações não serviriam de nada, mas cada um,
limitadamente, só via a si mesmo e o que sabia fazer (foram educados e viveram
suas vidas de forma fragmentada alem de demonstrarem muito apego ao seu saber
projetando-os na situação geral como o mais importante). Se as pessoas tivessem
percebido qual o principal problema no navio, teriam agido de forma mais coesa
e precisa. Se o comandante tivesse tido a ajuda certa, nenhuma das outras
atitudes dos passageiros seriam realmente necessárias para resolver o principal
problema que estava ameaçando a sobrevivência de todos (a água entrar, afundar
a embarcação e todos morrerem). Em urgências, como convencer pessoas “segmentadas”
a fazerem algo diferente em prol do mais importante?
Por analogia, podemos dizer que o nosso
planeta é o nosso transatlântico e que o nosso verdadeiro problema está sendo a
nossa forma de pensar. É o nosso software
biológico mental que está “furado” pelo egoísmo (egocentrismo) e o comandante
está pedindo a nossa atenção para o problema. Por aonde se chega ao software mental? Pela educação, pela
mídia, pela espiritualidade comum a todos e pelas religiões exercidas de forma
sábia, pela genética, pela cultura, pelo trabalho, pelo lazer, por toda a
atividade humana.
Quando tentamos resolver qualquer problema nós nos
deparamos com duas dificuldades básicas: o baixo nível de informação fragmentada
e, também, sistêmica dos integrantes e a necessidade de mudança de
comportamento de todos os envolvidos. O nível de informação se resolve com
estudos e como se resolve o problema da mudança de comportamento?
Ao examinarmos essa
questão, permitam-nos fazer uma analogia facilitadora com a área de
Informática. Supondo que o corpo humano seja um biohardware (parte física) e a mente seja um biosoftware (programa de informações), o software mental humano possuiria um sistema operacional chamado EGO
e nele caberiam muitos outros programas mentais.
O sistema operacional Ego
seria útil para o seu usuário se posicionar no mundo e se distinguir dos outros
egos. Entretanto, um subprograma chamado EGOCENTRISMO (ou Egoísmo), informaria
ao sistema operacional Ego, que ele deveria sempre privilegiar a ele mesmo em
detrimento de qualquer outra coisa. TUDO deve ser realizado para a sua
sobrevivência e para o seu engrandecimento sem nunca precisar se colocar no
lugar do outro por que o outro é um ser inferior e só serve para lhe admirar e
lhe servir. Se o outro sentir alguma dor, sofrimento ou perda isso não terá
nenhuma importância. A única coisa que importa é o que eu sinto e mais nada.
De forma breve, mas
necessária, pode-se dizer que o Ego
(eu) é um termo empregado na Psicologia e na Filosofia para designar a pessoa
humana como consciente de si e objeto do pensamento (Clément, 1994). Nas bases da
teoria psicanalítica, de forma resumida e simplificada, pode-se dizer que
Sigmund Freud colocou o conceito de ego como sendo uma instância psíquica
dentro de íntimas relações com outras duas: o “id” que seria a parte da mente
responsável por estimular o princípio do prazer e o “superego” que
representaria as exigências da realidade relacional ou a parte da mente direcionada para a moral, embutida de
todos os valores da sociedade em que vivemos
(Doron, 1998; Hanns, 1996 ).
Em nosso desenvolvimento psíquico o
superego forma-se após o ego e divide-se em dois
subsistemas: o ego ideal, que dita o “bem” a ser procurado; e a consciência
moral que determina as
“coisas erradas” a serem evitadas. Dessas
três estruturas, somente o ego aparece em outras teorias. O id e o superego são
próprios da psicanálise.
As relações entre o “id”, o “ego” e o “superego”
se dão, em sua maior parte, de forma inconsciente. Isso quer dizer que, segundo
a psicanálise, elas acontecem dentro da nossa mente e nós não sabemos tudo o
que está sendo movimentado e decidido. De fato, o mundo exterior nos impõe,
desde criança, pequenas proibições que provocam o recalcamento e a
transformação das pulsões, na busca de uma satisfação substitutiva que irá
provocar em nosso “eu”, um sentimento de desprazer. O ego representa o que pode
ser chamado de razão e senso comum, em contraste com o id, que contém as
paixões. Nesse caso, o princípio de realidade substitui o princípio de prazer.
O “eu” se apresentaria então, como uma espécie de mediador entre os conflitos
do aparelho psíquico que duram por toda a nossa vida (Hornstein, 1989; LOEWENSTEIN, 1981).
Já para Carl Gustav Jung o ego é o centro
da consciência, mas não é a consciência. Ele será uma reunião de ideias e
afetos em torno de um núcleo temático comum – o complexo da identidade de “eu”
ou o chamado Complexo de Eu. O Ego, segundo Jung, reúne tudo o que
sabemos de nós mesmos somando todas as ideias, afetos e imagens relacionadas ao
“Eu”. Para Jung, o que identificamos como sendo “não-eu” formaria a nossa parte
que ele chamou de “sombra” (Jung, 1996).
De forma
geral pode-se dizer que no “ego” reunimos nossos valores e nossa auto-imagem. A
grande maioria dos problemas do dia-a-dia se dá por uma má sintonia entre essas
questões e a realidade social cotidiana.
Uma pessoa
orgulhosa, por exemplo, é vista usualmente como sendo uma pessoa forte diante
dos outros. O orgulho é uma auto-admiração e em termos psicológicos, é um
caminho de retro-alimentação das energias do ego. Quanto mais orgulho, maior é
a força de um ego. Como uma espécie de blindagem, uma pessoa orgulhosa acaba
não vendo seus próprios erros ou não admitindo novas possibilidades ou qualquer
coisa que venha de fora ou que ameace a pseudo integridade do seu ego.
Essa
rigidez pode levar a algo bastante negativo. Se tudo no universo está em
constante transformação o tempo todo, inevitavelmente, as mudanças que a vida
vai exigir das pessoas de ego “forte” o levará a sofrimentos por ter que mudar
sem ser por sua vontade e decisão. Ela sofre, justamente porque não quer se
desfazer da imagem construída por seu próprio ego (apego). E é aí que nós nos
tornamos nossos maiores inimigos e passamos a ser danosos à sociedade.
Nesse contexto
surge o valor da humildade. Ela possui a característica de
descontrução/reconstrução do ego. Uma pessoa humilde conseguiu diminuir a
energia contida no ego permitindo que outras coisas possam vir à tona.
Certamente, é necessário utilizar menos inteligência arrogante e mais sabedoria
expansiva libertadora para se deixar fluir as transformações inerentes à vida.
Portanto,
de transformação em transformação as pessoas que se adaptam às circunstâncias e
libertam-se da opressão que a manutenção do ego exige, vão crescendo em estados
de felicidade. Quanto mais ela conseguir sair de dentro de si mesma e se
colocar no lugar do outro, mais harmonia ela vai gerando no ambiente em que
vive. Quanto menos egocêntrico, melhor.
Sendo muito
mais diversa, mais complexa e muito mais antiga do que a nossa, a filosofia
oriental prima pelo sentido de unidade entre todas as coisas que existe. A
percepção fragmentada das coisas é uma barreira no desenvolvimento evolutivo do
ser humano. Dito e explicado de várias formas no Budismo, no Taoismo ou no
Hinduísmo, o conceito de unicidade entre pessoas, animais, vegetais, planetas e
galáxias só pode ser compreendido quando for também vivenciado pela pessoa que
busca evolução.
E é
justamente aí que podemos observar uma grande diferença entre oriente e
ocidente. Do ponto de vista ocidental nós nos preocupamos muito mais com o
compreender do que com o vivenciar e sentir. A nossa relação com as leis da
natureza privilegia a cognição, o saber, o compreender e talvez por isso é que
não estejamos vivendo de forma feliz apesar de já sabermos tanto sobre tantas
coisas (Osho, 2014; Rinpoche, 2014).
É interessante praticar
alguns tipos de autoconhecimento sugeridos por outras culturas como: meditação,
yoga, taichi, dentre inúmeros outros e escolher aquele que melhor satisfaça as
suas atuais necessidades. Certamente, as necessidades vão mudar e pode-se
mudar, também, o tipo de vivência. Entretanto, em todos os momentos precisamos
ter foco e ação. O ideal é que essas
vivências estejam dentro de um grupo terapêutico ou haja alguma terapia ou
psicoterapia (individual ou em grupo) em paralelo para dar suporte resultando
em um maior proveito das experiências cognitivas e vivenciais em direção à
maturidade da unicidade.
Toda evolução é útil, mas não podemos nos contentar com pouca
evolução. Se comparássemos a evolução com uma escala imaginária de 0 (zero) a
100 (cem) em que o zero representasse a pessoa mais egoísta e egocêntrica do
mundo e o número cem representasse a pessoa mais altruísta e feliz do mundo,
evoluir, por exemplo, do estado 3 para o estado 4 ou evoluir do estado 93 para
o estado 94 seria, em ambos os casos, algo extremamente louvável e merecedor de
todos os méritos pelo simples fato de que a pessoa conseguiu melhorar a sua
própria evolução. Entretanto, se comparássemos uma sociedade comporta apenas
por pessoas com grau 4 de evolução com uma sociedade composta apenas por
pessoas com grau 94 de evolução, certamente, teríamos duas sociedades bastante
diferentes. Na primeira, reinaria a corrupção, as guerras e assassinatos, o
roubo, a fraude, a mentira, as ditaduras ou a infelicidade social disseminada.
Na segunda, constituída por pessoas mais evoluídas, predominaria a justiça, o respeito, a verdade
e o estado de felicidade crescente.
Cargos de decisões
econômicas e/ou legislativas, cargos que gerem ideias para a população na mídia
ou na Educação devem ser ocupados pelas pessoas de maior evolução de uma
sociedade e não o contrário. Apenas o nível de conhecimento técnico, carisma
pessoal ou nível de influência social não devem ser os únicos fatores a eleger
alguém para assumir responsabilidades pela qualidade de vida das outras
pessoas. Quanto menos ego melhor. Quanto menos egocêntrica e mais bem
informada, mais evoluída será uma pessoa.
Os mais evoluídos devem
governar os menos evoluídos. Os menos evoluídos devem lutar com unhas e dentes
pela sua evolução individual e coletiva. Juntos, todos precisam evoluir cada um
em seu grau e em sua velocidade. Para isso, os mais evoluídos precisam
proporcionar todos os meios possíveis para que todos cresçam e não desperdicem
suas inteligências e suas existências.
Do ponto de vista
prático, por exemplo, os currículos escolares precisam abordar, além das
disciplinas oficiais, questões contextualizadas da evolução humana com uma
linguagem adaptada para cada nível (do berçário à pós-graduação).
Para quem entende que a vida possua
algum tipo de continuidade, o fruto do que se faz, ou não, nessa vida levaria a
consequências no resto dela após a nossa inevitável morte. Para quem não acha
ou prefere não achar nada sobre a continuidade da vida, o momento presente é a
única coisa que existe. Portanto, por um motivo ou por outro, porque não ser
mais e mais feliz, mais livre e criativo agora mesmo independente do que o
futuro nos reserve? E se todos os futuros forem possíveis para cada um?
Não se contente com seus
atuais pensamentos e reflexões cotidianas. Pense mais, observe mais, sinta
mais, converse mais, leia mais, viaje mais para outras culturas e lugares
diferentes do seu. Uma vez, em profunda meditação, recém-formado e trabalhando
com pacientes terminais de Câncer e HIV/AIDS, decidi perguntar ao universo
(pensando em Jesus) o que viria do outro lado da vida quando eu morresse. A
resposta surgiu em minha mente com a seguinte frase: se Eu quiser, Eu posso
criar uma galáxia dentro de um átomo ou bilhões de anos dentro de um segundo só
para você ir vivenciar o que você mesmo acredita. Quase duas décadas depois,
estudando as teorias quânticas sobre universos paralelos percebi a
possibilidade de outras realidades paralelas poderem existir mesmo. Passei
então a respeitar melhor as minhas crenças mentais por que tanto o meu presente
quanto o resto da minha vida, poderá depender do que acredite ou não hoje.
Até que ponto a nossa
mente tem o poder de criar a realidade? Esse é um campo que está sendo bastante
discutido entre os atuais futurologistas. A preocupação imediata é: quais são
os pensamentos gerados pelas pessoas ao meu redor (minha rede)? O que a mídia está
implantando na mente das pessoas hoje? O que a Educação propicia como alimento
para as nossas mentes? Por que o Ministério da Saúde faz nada em relação aos
pensamentos coletivos se boa parte da nossa saúde depende deles? Existiria
alguma responsabilidade social nos meus pensamentos individuais? Nas minhas
emoções cotidianas egocêntricas?
A emoção que predomina em todas as atividades do egocentrismo é o medo. O
medo de não ser ninguém, o medo da não-existência, o medo da morte. Todas as
suas ações, enfim, destinam-se a eliminar esse temor. Dessa forma, o máximo que o egocentrismo
consegue fazer é encobri-lo temporariamente, seja controlando situações,
adquirindo um novo bem ou tendo um bom desempenho numa coisa ou noutra. A
sensação de “poder” engana o ego e o apego termina por ser a sua lógica
existencial. Na verdade, o ego termina vivendo numa bolha de ilusão porque tudo
se transforma o tempo todo no universo e ele não que ver isso.
É plenamente possível se pensar nos
problemas sem se pensar em soluções, mas é impossível se pensar em soluções sem
se conhecer os problemas. Inevitavelmente, a complexidade da solução é bem
maior.
Toda solução vai precisar de recursos
de todos os tipos, legislação, participação interdisciplinar, mudanças em
cargos de poder, dentre outras inúmeras coisas. Toda solução precisa, também,
de mudança de comportamento e é justamente aí que entra o lidar com o Ego
(individual e coletivo) e com o comportamento egoísta (egocêntrico).
Quando duas pessoas competem, a
vitória será sempre a do egocentrismo, na vaidade do vencedor, (também
perdedor) e na sensação de humilhação do perdedor (“duplamente” perdedor) mas
quando alguém luta contra o seu próprio egocentrismo, o vencedor será um dos
dois (ou a pessoa que fica livre com sua autonomia preservada ou o egocentrismo
escravizou mais um “adormecido”). Quanto
maior o egocentrismo, mais gravidade ele gera e mais ele atrai as coisas para
si. Dessa forma, ele vai aumentando a cada experiência que tiver com outros
egos. Simultaneamente, todos os egocentrismos de todos os egos passam a se
achar os melhores, gerando uma competição, mesmo que para isso necessitem
subjugar os outros, enganá-los, iludi-los, afastá-los ou até mesmo tentar
destruí-los.
O que você acha que aconteceu com os grandes
conquistadores da história? Eles foram heróis ou grandessíssimos egocêntricos
que matavam e roubavam para aumentar seus impérios (seus egos)? O que você acha
que acontece com os países ricos que exploram economicamente milhões de outras
pessoas pelo planeta só para usufruírem de conforto? Por que será que a espécie
humana utiliza as outras como alimento, vaidade, diversão sem respeito algum
pela coexistência deles? E quanto ao nosso relacionamento com o meio ambiente?
Precisaria comentar? Nós ainda nos consideramos o centro do universo. Achamos
que somos os melhores e estamos aqui para satisfazermos todos os nossos
desejos.
Cada ego precisa sentir-se diferente e melhor que os
outros. Por isso, criamos repetidas e conhecidas situações como, por exemplo, a
mentira, o roubo, a dominação, a persuasão, a corrupção, a ameaça, o crime, o
engano proposital, a manipulação, a distorção dos fatos, a escravização, a
inconsciência, o disfarce, a omissão (consciente ou não) e dezenas de crenças
que o fazem ser considerado, erroneamente, como o melhor e mais inteligente
caminho. Sem dúvida, precisamos de uma higiene mental diária e do evitar
contaminações constantes para que essas situações não predominem em nossa parte
mental. Certamente, muitos dos nossos problemas físicos e sociais são
consequências diretas desses estados mentais não higienizados.
Quem foi o “programador” que fez (ou ainda está
fazendo) o software mental humano? O
egocentrismo é um software mental tão
eficiente que parece ter a capacidade de programar-se e perpetuar-se por
gerações e gerações de seres humanos (seus hospedeiros).
Pode-se até achar que tudo de que precisamos para
nos livrar dos problemas gerados pelo egocentrismo é estarmos conscientes dele,
uma vez que ele e a consciência são incompatíveis. Ou então, pode-se achar que
o ego seria apenas um degrau indestrutível na escada da evolução, em que todos
precisam passar por ele para poder continuar a evoluir.
Já morreram os piores egoístas da história da
humanidade, já executamos alguns deles e os que estão vivos vão morrer em
alguns anos. Nesse contexto, percebe-se que os usuários desaparecem, mas o software mental não. Precisamos, pela
educação, criar egos mais saudáveis.
Portanto, não adiantaria pena de morte para todos os
bandidos porque eles têm se sucedido ao longo da história. O que tem que
desaparecer é a programação errônea do software
mental ego, pois esta programação é a nossa principal e verdadeira inimiga, e
não uns aos outros como o próprio egocentrismo quer que achemos para que ele
fique trabalhando eternamente sem ser percebido ou flagrado. Analogamente,
destruindo os computadores não se destrói o sistema operacional da empresa de softwares e nós, seres humanos, já
nascemos com o ego (egocentrismo) instalado “de fábrica”.
Pequenas medidas de controle do egocentrismo têm
surtido algum efeito como: criar leis, punir, vigiar, ameaçar, educar as
pessoas, desenvolver espiritualidade, refletir, respeitar, amar, dentre outras.
Ainda estamos dando muito poder às pessoas egoístas (em governos, empresas,
lideranças religiosas, nos esporte, nas artes,...). Temos que desenvolver
aparelhos para ler o pensamento deles enquanto estiverem em cargos de poder (a
verdade liberta).
Os mais evoluídos (menos egocêntricos e mais bem
informados) é que deveriam governar os menos evoluídos (mais egocêntricos).
Precisamos priorizar as nossas principais pesquisas e
gastos humanos para solucionar os problemas causados pelo nosso próprio egocentrismo.
Todos os outros investimentos se tornam menores (Armas, Medicamentos, Energia,
Economia,...) diante da necessidade de “eliminarmos” a predominância do
comportamento egoísta (egocentrismo). Ele é o maior gerador de problemas na
humanidade e quando alguma solução aparece, ele aplica uma das suas principais
metodologias: a preguiça mental. Embora negligenciada pela área “Psi”, ela,
quando associada à autossabotagem, torna-se um dos principais instrumentos de
monopolização de comportamentos do software
egocentrismo sobre nós seres humanos.
Do
mesmo jeito que o tamanho do furo no casco de um navio
pode determinar se vai dar tempo para ele chegar ao estaleiro ou não, o tamanho
do egocentrismo – que, como vimos, é o furo no casco da humanidade - pode
determinar se vamos nos autodestruir ou não.
Nada está sendo mais importante: superar essa fase
humana. O ego entrou em uma época e sairá em outra. Para isso, o nosso nível de consciência sobre quem somos e os
propósitos da vida, precisam de constantes ampliações individuais e coletivas.
Seria interessante termos em mente que o nível mínimo
seria a pessoa que só percebe a si mesma (o seu Ego é o centro de tudo) e o
nível máximo seria quando a pessoa sente que seu Ego é o próprio universo
(unicidade), transcendendo a si mesma. O termo “nível de consciência” é extremamente
polêmico e pode ser estudado das mais diferentes concepções. Partindo das
concepções de Grof (1987) poderemos estimar algumas considerações particulares
para estabelecer três níveis mínimos de consciência: restrito, ampliado e
expandido.
Nível Restrito: nesse nível, a pessoa só consegue
pensar nas coisas imediatamente próximas a ela ou naquilo que os seus sentidos
captam. Ela será inteiramente egocêntrica, quase não pensará no bem-estar das
outras pessoas e perceberá o mundo como sendo apenas o seu mundo. Ela é muito
passiva aos acontecimentos (visão segmentada). É no nível restrito que se
encontra a maioria das pessoas. A maior parte da população mundial não vive,
luta pela sobrevivência e são totalmente escravas da mídia que termina por não
perceber o quanto são prejudiciais as diárias e constantes cenas de morte, dor,
angústia, opressão, sofrimento e medo. Por elas não apresentarem soluções para
os problemas que expõem, elas criam um gigantesco padrão de ressonância
coletiva que adoece, de várias maneiras, as pessoas e a sociedade. Infelizmente,
também se encontram nesse nível de consciência, boa parte dos políticos, que
detêm o poder das leis e as verbas governamentais e a maioria dos empresários,
que possuem e movimentam o capital.
Nível Ampliado: no nível dito ampliado, a pessoa já
começa a se preocupar com as outras pessoas, emociona-se com os noticiários que
mostram pessoas em situação de risco, etc., mas não consegue realizar nenhuma
atitude em favor dos outros. Ela já não é tão passiva e tão manipulável pela
mídia. Processa um número maior de informações e passa a ser crítica em relação
aos acontecimentos. Por exigir mais das condições mentais do ser humano, quanto
mais ampliado for o nível de consciência, menos pessoas farão parte
desse nível.
Nível Expandido: no nível expandido, a pessoa chega a sair do seu mundo, vai até ao
encontro das pessoas necessitadas e desenvolve, com elas, diversas ações de
ajuda. Ela, além de ser crítica em relação aos acontecimentos, também parte para
agir, mudar e fazer alterações significativas na história (pessoal e coletiva).
Esse nível comporta uma minoria de pessoas. Ele requer
bem mais maturidade e desprendimento, inteligência, sabedoria, experiência e
vontade ou sentimentos de amor e compaixão. Que bom seria que as pessoas que
ocupam cargos de poder em nossa sociedade possuíssem um nível expandido de
consciência.
Portanto,
nesses simplificados três níveis que foram resumidamente descritos, percebe-se
que viveremos melhor em uma comunidade que tenha menos mentes funcionando com o
nível restrito e mais mentes que estejam funcionando no nível expandido.
É
importante estarmos conscientes de que não basta elevar nosso nível de
consciência e querer ser participativo, temos que ter informação e experiência
para gerenciar os nossos complexos problemas sociais. Como por exemplo,
precisamos substituir as nossas relações de exploração uns com os outros (entre
classes sociais, entre os diferentes níveis intelectuais, entre países, etc.) e
passar a nos relacionar com relações de parceria e mútua ajuda, distribuindo
melhor a renda, o conhecimento e as oportunidades, dentre outras coisas.
Para identificarmos nosso atual nível
de consciência, precisamos de menos ruídos, menos poluição visual e precisamos,
também, de mais tempo para nós mesmos. O autoconhecimento é fundamental para
realizar mudanças conscientes no ego. Nesse caso, o acaso não é a opção. Lidar
com o ego é algo extremamente sério e difícil. Basta vermos o estrago que o egocentrismo
já causou e ainda causa na humanidade. O ego recusa-se a acreditar que ele
realmente não existe isoladamente de forma autônoma, que ele é uma criação
mental nossa por que todos nós somos Um (não existem partes no universo). Para
a compreensão disso precisa-se de dedicação e criatividade transparentes como a
água (simples e fundamental para a vida). Entretanto, para estar sadia dentro
de nós e fazer parte do nosso ser, ela precisa de qualidade.
O que você pode fazer agora mesmo por
você (evolutivamente)? O que você pode fazer pela humanidade? Nunca deixe de
fazer essas perguntas a você mesmo. Nunca deixe de fazer essas perguntas às
outras pessoas. E se decidiu fazer alguma coisa... Faça!
Portanto, diante de tantas necessárias
transições, as três principais prioridades seriam: 1-todos devem ter acesso à
informação de qualidade. 2-todos os mecanismos do egoísmo humano precisam ser
estudados e todos precisam saber como a sua mente inconsciente funciona (disso
dependerá tudo). 3-as verdades precisam prevalecer. Dessa forma, quanto maior o
nível de consciência em um maior número de pessoas, maior serão as
probabilidades de sucesso. Quem ainda não sabe que estamos com um “furo no
casco”, precisa saber. Quem só sabe fazer uma coisa, precisa aprender a fazer
outras. Quem ainda não sabe alterar em seu próprio software biológico mental, precisa aprender a fazer isso. Quem se
responsabiliza pela educação de outros, precisa atuar consciente do contexto em
que estamos. A evolução não pode ser deixada ao acaso. Seremos ativamente
conscientes.
Sem dúvida, não poderemos errar na escolha de
prioridades. Se um dos problemas representar a destruição total, ele será focalmente
o mais importante e urgente.
Figura_____: representação do ciclo dinâmico
inseparável entre o estar vivo, ter qualidade de vida e evoluir infinitamente.
Portanto, primeiro precisamos interativamente estar
vivos para depois pensarmos em qualidade de vida (em via de mão dupla). Do
mesmo modo, não basta estar vivo. Precisamos dar sentido ao ato de viver. E um
importante sentido para se evoluir é migrar do estado egocêntrico (apego
exacerbado) para o estado de amor incondicional (desapego).
Não se concebe mais, um profissional da área de Saúde
que trabalhe sozinho ou apenas com seus pares (fragmentação). Pensar e atuar em
saúde é estar em equipe de Saúde prevenindo, diagnosticando, intervindo e
promovendo alta de forma coletiva. O sucesso ou insucesso de qualquer
intervenção devem ser creditados à equipe de trabalho e não a um dos
profissionais.
Para as gerações futuras tudo vai ficando mais difícil
pelo fato de disporem de um gigantesco número crescente de informações
disponíveis, pela necessidade de maior processamento de grandes pacotes
informacionais, pelo aumento da população, pela diminuição de recursos naturais,
dentre outros. Certamente, os novos conhecimentos que serão gerados no futuro precisaram
proporcionar, também, novas soluções.
Não é difícil prever que, pelo aumento progressivo e
constante da velocidade de produção de conhecimento aliada a necessidade bem
maior de processamento de informações e da existência de diferentes
terminologias e linguagens entre as distintas áreas do saber, uma grande crise
está por vir se as capacidades intelectuais humanas continuares as mesmas.
Precisamos sair da nossa “EGONORÂNCIA” (egocentrismo +
ignorância) no sentido de deixar de achar que a nossa área do saber seja a mais
importante e ignorar o como a natureza, em seu sentido mais amplo, realmente é
e se comporta.
A INFORMAÇÃO é o maior patrimônio da humanidade e o autoconhecimento
precisa fazer parte de todas as etapas de vida de uma pessoa. Assim como
aprender disciplinas como, matemática, química, biologia, dentre outras, deverá
ser parte integrante e obrigatória o autoconhecimento no sentido de que
possamos, individual e coletivamente, assumirmos planos de evolução de
diminuição do nosso e egocentrismo e evolução da própria espécie.
Certamente, um futurologista, diante de tantos avanços
bionanotecnológicos informacionais, poderia concluir que a linguagem humana, como
a conhecemos, entrou na espécie humana em um ponto e sairá em outro, mas
enquanto isso não acontecer teremos que pensar em uma simplificação na
linguagem utilizada por tantas diferentes áreas do saber que precisam
interagir, agora cotidianamente. Para isso teremos que abandonar termos e
neologismos para utilizar uma linguagem popular, mais conhecida e acessível a
todos.
A sabedoria estará no simples e não no complexo. De
forma geral, precisamos evitar neologismos complexos, precisamos utilizar a
linguagem coloquial sem apego aos termos que apenas fornecem status e
autoafirmam algumas áreas do conhecimento. É nosso próprio o egocentrismo que
hipnoticamente nos diz: eu sei de alguma coisa que os outros não sabem; sou
melhor que os outros; eu tenho um conhecimento que os outros não têm; eu quero
o seu respeito pela minha capacidade de ter aprendido algo tão difícil; não dê
opiniões na “minha” área porque você não entende nada; quer comprar o meu
conhecimento? Eu fabrico dificuldades para vender facilidades.
Não aos
“guetos” e sim à compreensão geral. Não às metodologias engessadas e sim às
metodologias científicas que atinjam melhores resultados para as soluções. Se
um método não serve, fique contra ele, crie outro e faça diferente (FEYERABEND,
1977).
Uma
das coisas que mais atrapalham a vida do egocêntrico é justamente a humildade.
E isso não se ensina na escola junto com o conhecimento. Entretanto, ela será
uma das ferramentas mais importantes para se colocar no lugar do egocentrismo.
Apesar de complexas as soluções também pode ser simples.
Hoje,
devido ao conhecimento dos conceitos de rede, interconexão e não linearidade, afirmar
que se tem certeza sobre alguma coisa significa demonstrar aos bem informados o
quanto se está pouco informado ou, ingenuamente, o quanto se está empolgado por
uma área do conhecimento sem perceber as suas inúmeras interconexões com as
demais (equívoco sincero). Como é a sobrevivência da nossa própria espécie que
está em jogo, não poderemos ser ingênuos.
Portanto, quem é de estudos macro que os estude e que
é de estudos introspectivos que os estude. Tão importante quanto descobrir
novas informações será descobrir novas formas de integração entre as que já
possuímos. Assim como a simultaneidade de uma Sístole (contração do coração) e
de uma Diástole (expansão do coração) que mantém a vida humana, nós sempre
precisaremos da simultaneidade da introspecção (individual e
coletiva) e da macropolítica (em alternância contínua) porque ambos
os movimentos se complementam e são necessários para a vida.
Do ponto de vista ideológico, temos que sempre
questionar o fruto do nosso trabalho e o fruto da nossa ciência. Ela pode estar
a serviço do egoísmo de governantes e/ou empresários. Temos que ter a
versatilidade de sermos conservadores, reformistas ou revolucionários a
depender da necessidade e/ou condição que alguma solução exija. Conservador
preferindo que todo o sistema de relações sociais fique exatamente como está, o
Reformista quando concordar com o sistema social vigente, mas queira fazer só
algumas reformas nele mantendo o principal ou sermos revolucionários não
concordando com o sistema vigente e propondo a substituição dele por outro explicando
detalhadamente qual seria esse outro sistema (Demo, 1996).
Engana-se quem
pensa que a atividade científica pode ser neutra. Ela é útil para alguém. Ela
pode estar servindo para a egocêntricos realizarem a exploração de pessoas ou
ajudando a resolver o problema da maioria. Como a ciência não é neutra, o papel
da informação de qualidade que circula entre governos, empresas e entidades da
sociedade civil passa a ser alvo de interesse econômico e político em que a
ideologia subjacente será possibilitadora, em potencial, da formação e
manutenção ideológica que, segundo Demo (1996), para os que estão no poder:
“cientista bom
é aquele que se apropria de conhecimentos para dominar a realidade, mas é
essencial que não seja crítico, o que faz da ciência, tendencialmente, produto
conservador ou pelo menos útil à ideologia conservadora, na figura do idiota
especializado: competente formalmente, tapado politicamente”.
(grifo do autor).
Portanto, torna-se
necessário ressaltar a importância da utilização da informação para a contínua
educação política, para que pessoas, categorias profissionais ou teorias
científicas não sejam utilizadas em benefício de grupos opressores de alto
egocentrismo que só pensam neles mesmos e em mais ninguém. Por isso, o ser
crítico deve perpassar tanto as decisões de eleição de prioridades quanto as
decisões de gestão e avaliação de todos os programas públicos.
É importante evidenciar que o conhecimento científico
habita pessoas e, em nossa diversidade, pode-se encontrar diferentes
personalidades, experiências culturais, interesses pessoais e políticos,
diferentes posturas ideológicas e, principalmente, estados maiores ou menores
de egocentrismo cuja atuação em rede exige certo grau de maturidade e evolução.
Certamente, em uma equipe multiprofissional iremos encontrar diferentes
posturas ideológicas (conservador, reformista ou revolucionário) e diferentes
graus de egocentrismo ou benevolência.
Portanto, ao
somarmos todos os aspectos aqui resumidamente abordados, o principal desafio do
conhecimento parece ser a necessidade de integrar conhecimentos “criando” uma
unidade (que sempre existiu), focar a utilidade do conhecimento para a solução
dos problemas que criamos em nosso convívio e priorizar o que for mais urgente
em termos de sobrevivência da humanidade e da sua qualidade de vida.
Precisamos
ter a solução como foco em todas as mídias e na Educação. De
forma geral, por que a maioria das pessoas não demonstra interesse pelo
aprofundamento de assuntos ligados à solução de problemas?
Protestar é bem mais fácil. Como as soluções são mais
complexas e exigem medidas jurídicas, econômicas, sociais, ações em redes
interativas para atuação conjunta, dentre outros, inevitavelmente, toda solução
além de exigir mais inteligência, precisa de alguma mudança de comportamento
por parte de quem está no poder, na liderança de empresas e por parte também,
da população. Como sabemos ninguém quer ceder privilégios, todos só pensam
apenas em si mesmos travando qualquer processo de mudança de comportamento. É
bem mais fácil fazer músicas de protesto, ações de rua, entrevistas ou
reportagens de denuncias sem estarem acompanhadas de opiniões detalhadas de
como resolver o problema denunciado. Para isso, além de criatividade precisa-se
estar bem informado, consciente e, sem aquela preguiça existencial, estar
disposto a realizar mudanças.
Os estudantes? Eles não têm condições de propor
soluções por causa do seu pobre currículo. A atual escola não aborda,
suficientemente, assuntos ligados às soluções de problemas e as disciplinas são
usualmente desvinculadas da realidade. Eles não sabem como resolver porque
simplesmente não praticam essa virtude.
Os profissionais? A super especialização e a linguagem
excessivamente técnica provocam uma distância enorme entre uma profissão e
outra (eles também foram formados em currículos alienados politicamente e
fragmentados teoricamente). Os profissionais precisam lutar pela sobrevivência
e não se reúnem com propósitos dessa natureza (coletiva). Normalmente, não se
questiona filosoficamente o que e faz.
Os políticos? O egoísmo deles é tão patológico que
eles só legislam em causa própria e passam a vida correndo atrás de comissões,
cargos de poder e na sua reeleição. Se para alguma solução for necessário que
eles percam alguma coisa, eles simplesmente a ignoram. A lógica do poder e
manter-se no poder e conseguir mais poder (uma programação bem típica do “software mental ego”).
A imprensa? Ela está a serviço da audiência e da
manipulação político-econômica. Toda solução implica em ter que ficar contra
algum poder egoísta vigente. Nem toda causa pública é de interesse público.
Entre a tragédia ou um debate sobre a solução de algum problema, as pessoas
“adormecidas” preferem assistir as tragédias. A nossa criatividade precisa
inventar alternativas para a solução passar a, também, dar ibope.
Os religiosos? Com eles acontecem três problemas.
Primeiramente, eles também provêm da parte da sociedade que não teve acesso
educativo às soluções de problemas (educação alienada e fragmentada). Em
segundo, pode-se dizer que no Brasil, as religiões não possuem o hábito de
ficarem contra os corruptos e contra os desmandos do poder. E em terceiro,
identifica-se uma excessiva estimulação da relação Ser Humano - Divindade
(relação vertical) e não a relação Ser Humano - Ser Humano (relação horizontal)
ficando as causas sociais sem a participação direta da maior parte da
comunidade religiosa e espiritualizada. Se não fossem os poucos que fazem
alguma coisa, mesmo que de forma assistencialista, a população de menor poder
aquisitivo etária em uma situação ainda pior.
Colocando a
solução como foco, corremos o risco de resolver nossos problemas. Certamente,
um mundo com a maioria dos nossos atuais problemas já resolvidos será bastante
diferente do atual. A nossa forma de sobreviver, trabalhar, consumir, praticar
esportes, estudar, etc., ou seja, viver sem a doutrina do egocentrismo será
surpreendentemente muito mais criativa e livre.
Depois que os
novos paradigmas nos deixaram sem as certezas dos nossos principais
referenciais e demonstraram que era inconsistente a compreensão que possuíamos
sobre como era a realidade e como a vida humana precisaria se organizar para
afluir melhor, muitos de nós estão mudando como pessoa e como profissional
junto com os seus conhecimentos científicos.
Tudo agora se resuma à relações entre redes. Trata-se
de uma metáfora, devido à percepção
da realidade como uma rede de relações interconexas, em que a existência está
condicionada às múltiplas relações, representando os fenômenos observados sem
hierarquias nem alicerces. A própria ciência nos ensina hoje, que tudo está em
movimento e cada um de nós representa um movimento específico diferenciado,
assim como um redemoinho de um rio, em que não se sabe onde um começa e o outro
termina, todo o Universo seria como um grande rio em que não sabemos aonde ele
começa ou aonde nós terminamos. A única coisa que se sabe é que TUDO está em
movimento e que somos feitos da mesma coisa (Energia-Consciência).
Aplicando
tais conhecimentos científicos, você já começou a sua mudança pessoal? A sua
ciência já começou a mudar? Em que momentos a sua prática profissional está
recebendo alterações concretas? E quanto
ao nosso próprio egocentrismo? Podemos fazer alguma coisa? Como e quando? Que
tal utilizarmos tabelas individuais com as características da que segue?
(X)
|
ATIVIDADE
|
QUANDO?
|
(X)
|
ATIVIDADE
|
QUANDO?
|
( )
|
Lerei mais sobre o assunto
|
|
( )
|
Entrarei para algum grupo religioso
|
|
( )
|
Entrarei em algum grupo de estudo
|
|
( )
|
Farei um grupo de estudo
|
|
( )
|
Participarei de listas de discussão on-line
|
|
( )
|
Conhecerei pessoas com o mesmo interesse
|
|
( )
|
Farei psicoterapia (individual ou em grupo)
|
|
( )
|
Farei cursos nessa área
|
|
( )
|
Escolherei algum tipo de meditação
|
|
( )
|
Viajarei para conhecer lugares místicos
|
|
( )
|
Farei militância política partidária
|
|
( )
|
Não pretendo fazer nada agora
|
|
( )
|
Entrarei para alguma ONG
|
|
( )
|
|
|
( )
|
Procurarei ter alguma experiência transcendente
|
|
( )
|
|
|
Particularmente, a
minha ciência está mudando na medida em que ela está sendo percebida como mais
uma construção humana, mais uma cosmovisão semelhante às tantas religiões ou
ciências que criamos para entender a vida ou para obter algum conforto
existencial. Como construção criada por “mim”, ser humano, não posso ter apego
à sua forma nem ao seu conteúdo. Tenho liberdade para alterar e recriar o que quiser.
Urgentemente, a minha ciência tem que deixar de servir à minha curiosidade de
cientista e passar a servir à melhoria da nossa qualidade de vida, antes que
não reste mais vida humana neste planeta.
Assim como a nossa
forma de pensar pode ser o nosso maior problema, a nossa nova forma de pensar
poderá ser a nossa principal solução.
Sobre a minha
mudança pessoal, graças ao conceito de unicidade, quem mais tem sofrido é o meu
“ego”. Na maior parte do meu tempo lúcido, percebo-me como apenas mais um movimento
da rede de relações interconexas, minha casa é o planeta, você e eu somos Um
com o meio ambiente, plantas e animais e minha família é toda a humanidade.
Como esse “nosso” corpo é muito grande, é importante reconhecermos que estamos
muito doentes e não conhecemos exatamente a cura. Talvez, o mais importante
seja assumirmos humildemente as nossas limitações e nunca pararmos de tentar
fazer diferente até acertarmos.
No preparo das
novas gerações não podemos esquecer de apresentar a vida para eles de uma forma
diferente da que nossas escolas nos apresentaram.
Consensualmente,
as metodologias ativas de aprendizagem estão comprovando a sua maior
eficiência. Aqueles que utilizam o método de Aprendizagem Baseada em
Problemas-ABP (Também na Aprendizagem Baseada em Pesquisa ABP) ou na
PBL (Problem Based Learning)
percebem, logo de início, a diferença de motivação, de participação e de
aprendizagem dos alunos. Com diversas adaptações pelo mundo, cada instituição cria
o modelo que mais se ajusta às suas necessidades de acordo com seu perfil.
Como toda solução é coletiva, o egocentrismo não tem
chances de se fortalecer nas metodologias ativas. Dessa forma, resolvendo
problemas desde o início de sua formação, fica bem mais motivador aprender e,
também, ser um gestor e não apenas ficar decorando teorias alheias para receber
notas e passar de ano em seus cursos de origem.
Comparando
os dois contextos de aprendizagem:
AULA TRADICIONAL
|
APRENDIZAGEM BASEADA NA
RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
|
O professor está no centro
do ensino.
|
O aluno está no centro da
aprendizagem.
|
O professor assume um
discurso autoritário e centralizador.
|
O tutor/professor assume um
discurso polêmico compartilhando poderes e responsabilidades.
|
Professor repassa conteúdos
e alunos ficam numa relação de dependência.
|
Tutor facilita a
aprendizagem estimulando a autonomia dos alunos (aprender a aprender).
|
Salas com muitos alunos
(50-70) (Sistema de disciplinas isoladas – massificação).
|
Salas com apenas 10 a 12 alunos (Sistema de
módulos integrados. Todos os cursos juntos em uma sala).
|
Atividades práticas só após
alguns períodos (descontextualização).
|
Teoria e prática integrados
desde a primeira semana de curso (contextualização imediata).
|
Aprende conteúdos para
passar em exames e tirar boas notas.
|
Apreende conteúdos para
resolver problemas reais e tirar boas notas.
|
A avaliação é pontual
servindo para policiamento e quantificação de resultados.
|
Avaliação é processual
servindo para readaptações imediatas e crescimento mútuo contínuo (individual
e coletivo).
|
Há um predomínio da
segmentação (individualismo).
|
Há predomínio da visão
sistêmica (crescimento individual e coletivo).
|
Forma profissionais
distantes da realidade, com pouca habilidade para gerenciar conflitos de
interesse em equipes de trabalho. Não possui a habilidade de integrar os Três
setores da sociedade.
|
Forma profissionais
totalmente integrados à realidade, com mais habilidades para o trabalho em
equipe e gestão de serviços nos três setores da sociedade (Governo, Empresas
e Entidades da Sociedade Civil).
|
É um modelo mais fácil de
ser aplicado e mais cômodo. Entretanto, mais caro e não protege contra a
evasão escolar.
|
Inicialmente é mais difícil
e exige mais envolvimento de professores, gestores funcionários e alunos.
Entretanto, é mais econômico e protege a instituição contra a evasão escolar.
|
Postura passiva e pouco
reflexiva.
|
Postura participativa,
crítica, criativa e dinâmica.
|
O aluno,passivamente, segue
cumprindo obrigações pré-determinadas.
|
O aluno faz planejamento e
gestão de carreira profissional desde seu primeiro ano. Ele é estimulado a
engajamentos sociais locais, redes nacionais e internacionais.
|
Não aprende a resolver
problemas complexos (visão segmentada da realidade).
|
Desenvolve habilidades e
competências para resolver problemas complexos (visão em rede).
|
É mais formal e mais
repetitiva.
|
É mais criativa e mais
divertida.
|
Certamente, quando
o nosso SUS tiver uma mão de obra mais bem qualificada, menos egocêntrica e
hábil em resolver problemas, deixaremos de ver tantos comportamentos
incompetentes e desonestos em todos os níveis (Municipal, Estadual e Federal).
Do mesmo modo, passaremos a ter uma população mais engajada, participante e
obtendo mais e melhores resultados reduzindo todos os indicadores de problemas
de saúde para patamares aceitáveis.
Que
tal todos os profissionais de Saúde se sentirem fazendo parte de um mesmo corpo
epidemiológico? No sentido descrito por Rouquayrol (1999), a epidemiologia é:
“A Ciência
que estuda o processo Saúde-Doença na Sociedade, analisando a distribuição
populacional e os fatores determinantes do risco de doenças, agravos e eventos
associados à Saúde, propondo medidas específicas de prevenção, controle ou
erradicação de enfermidades, danos ou problemas de Saúde e de proteção,
promoção ou recuperação da saúde individual e coletiva, produzindo informação e
conhecimento para apoiar a tomada de decisão no planejamento, na administração
e na avaliação de sistemas, programas, serviços e ações de Saúde”.
E ainda, paralelamente, distribuirmos melhor a
realização de pesquisas participativas e pesquisas ação (THIOLLENT, 1998). Na visão
fragmentada a maioria dos estudos limitam-se a coletar dados, realizar perfil
disso e daquilo, fazer pesquisas de opinião, etc. Elas não abordam a solução
dos problemas que tanto investigam. Tais dados terminam não sendo utilizados
para coisa alguma a não ser para aprender metodologia científica e pontuar
currículos de alunos, professores e instituições. Que tal em todos os estudos
de levantamentos de dados, cobrarmos dos autores algum capítulo com temáticas
assim: perspectivas de solução, soluções indicadas, roteiro para soluções em
curto, médio e longo prazo ou ainda, metodologia de soluções a ser empregada,
dentre outras, contanto que o autor, presumivelmente a pessoa mais atualizada
no tema estudado, possa indicar o melhor caminho para resolver os problemas que
ele mesmo identificou e aprofundou.
REFERÊNCIAS
ESTA OBRA AINDA ESTÁ EM CONSTRUÇÃO . . .